Lembro
que naquele dia eu tinha acabado de chegar no serviço. A TV como de costume,
está sempre ligada e sem som e pelo horário o noticiário local está sendo
transmitido. Olhei para a TV e vi uma cena que me deixou meio que preocupado. O
helicóptero transmitia uma cena de um homem branco, careca de regata e cueca em
pé na ponte do Rio Pinheiros, prestes a se suicidar. Já não bastasse no dia
anterior um homem ter se jogado na linha do metrô na estação Bresser e outra
pessoa no domingo na estação Vila Matilde. Por este momento esqueci que isto
não é mostrado na TV.
Logo
a cena sumiu e eu imediatamente comecei uma busca pela internet tentando
encontrar alguma notícia para entender o caso do tal suicida do Rio Pinheiros,
nada. E assim dei continuidade em minha vida. Alguns dias depois de ter
esquecido o episódio, descobri que tudo não passava de uma obra de arte. É bem
realista e hoje quando venho ao trabalho vejo o tal careca prestes a saltar
rumo às águas turvas do Rio Pinheiros.
O
pior é que não foi apenas eu que tive tal impressão de alguém tentando se
suicidar, o Corpo de Bombeiros, juntamente com a Polícia Militar já receberam
centenas de ligações relatando sobre a tentativa de suicídio da obra do artista
plástico Eduardo Srur. E agora me questiono se esta obra de arte realmente alcança
o seu objetivo que é mostrar o descaso com o Rio? Talvez sim. Será que ela não
poderia fazer com que uma mente mais fraca não tentasse o mesmo? E com relação ao
trânsito, o motorista mais desatento ao notar tal cena não poderia correr o
risco de causar um acidente? Concordo que São Paulo carece de mais obras de
artes assim a céu aberto, mas o impacto às vezes pode atrapalhar serviços de
órgãos como o Corpo de Bombeiros e a Polícia Militar que em uma dessas ligações tiveram
que encaminhar uma viatura até a ponte, certeza que melhor estaria esta viatura
em patrulhamento do que atendendo um caso de uma obra de arte prestes a cometer
suicídio.
Por
falar em suicídio, quero relatar alguns dados bem interessantes que impactam a
vida de várias pessoas diretamente e indiretamente pelo suicida. Como por exemplo, os familiares de um
suicida, muitas vezes ficam sem entender o que aconteceu com seu ente querido
para que ele/ela tomasse tal atitude e muitas vezes precisam de tratamento
psicológico para poder dar prosseguimento a sua vida e pior muitas vezes se sentem culpados, ou seja o problema só acaba para o suicida, a família é quem sofre. Como Nietzsche disse "a ideia do suicídio é uma grande consolação, só ajuda a suportar muitas noites más".
Só aqui no Brasil
diariamente 26 pessoas se suicidam e enquanto que em países como Portugal, a
taxa tem sido de 3 ocorrências por dia e tendo no máximo 6 casos diários, um
triste número que a cada dia vem aumentando. Ao longo de minha pesquisa
descobri o SICO (Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos) que é
disponibilizado pelo Governo de Portugal e pude monitorar estes dados que
muitas vezes chegam a ultrapassar a quantidade de homicídios diários. Já por
aqui, no Datasus (Banco de dados do Sistema Único de Saúde) o suicídio é classificado como “mortes por
lesões autoprovocadas voluntariamente”, e me vem uma pergunta porque não tratar
diretamente pelo nome suicídio, até poderia, mas ainda se predomina o tabu.
Por
se falar em tabu, talvez se o tema suicídio fosse tratado de uma maneira mais
aberta, em casa, na escola e até mesmo pela imprensa, talvez os casos
diminuíssem, mas existe um problema por trás de tudo isso, há quem pense que
falar sobre o suicídio faz com que o ouvinte seja induzido a se matar. Mas não
é bem assim, creio que não temos tanto poder de indução ao ponto de influenciar
outras pessoas a se matarem. Penso que é necessário tratar este assunto de
maneira aberta, só assim podemos descobrir se a pessoa está passando por um
momento que ela pense em cometer o ato. Um número bem interessante é que 17% da
população brasileira já pensaram em se matar alguma vez na vida e dos quais
4,8% já chegaram ao ponto de fazer um plano. Segundo a OMS, 90% dos podem ser
evitados, mas para isso é necessário destruir este tabu.
E o que leva uma pessoa a cometer o suicídio, as causas podem ser muitas como a depressão, o alcoolismo, transtorno de personalidade como o anti-social, perdas recentes de emprego, rompimentos de namoro, medo da solidão, entre outros fatores. O sociólogo Émile Durkheim classifica o suicídio em três tipos, o egoísta, o altruísta e o anômico, ou seja no primeiro caso, o indivíduo tem os laços fracos com a sociedade e acredita piamente que não fará falta para ninguém. Já o suicídio altruísta/filantrópico, o indivíduo vê o mundo social sem importância e então comete o suicídio pensando em um ideal, por exemplo seria caso dos kamikazes e os homens-bomba. A última, o suicídio anômico, o indivíduo comete o suicídio por não se identificar com o ambiente e normas da sociedade em que vive e então comete o ato contra a sua vida como uma fuga da realidade.
Quero encerrar o texto com
alguns números da OMS:
- Em 2003, aproximadamente
900 mil pessoas se suicidaram no mundo
- O suicídio está
entre as três maiores causas de morte na faixa etária entre 15 e 35 anos.
- 1,4% do ônus global
ocasionado por doenças no ano de 2002 foi devido a tentativas de suicídios, e
estima-se que chegará a 2,4% em 2020.
- Neste mesmo ano de
2020, a OMS estima que haverá 1,5 milhão de vidas perdidas por suicídio.
- O Brasil está entre
o grupo de países com taxas baixas de suicídio.
- No entanto, como se
trata de um país populoso, está entre os dez países com maiores números
absolutos de suicídio (7.987 em 2004).
- A taxa de suicídio
entre jovens cresce 30% em 25 anos no Brasil.
- Por hora uma pessoa comete suicídio no Brasil.
Prevenção
A
ONG CVV – Centro de Valorização da Vida é uma organização que se baseia no
trabalho voluntário em todo o território brasileiro e tem como missão prevenir
o suicídio, e para isso o Programa de Apoio Emocional ajuda pessoas que estejam
necessitando de um ombro amigo para conversar sobre o suicídio e por meio de
atendimento por chat, telefone, e-mail ou pessoalmente busca prevenir este ato.
Diminuir
o suicídio é um verdadeiro desafio e só com o empenho dos governos, da mídia, e uma conversa de uma maneira aberta por parte dos cidadãos poderia ajudar a solucionar esta
epidemia que se alastra continuamente, o que importa é a vida e é necessário a preservar.